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UMA PÁSCOA DIFERENTE

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Vila Nova de Santo André

        Esta Páscoa está a ser diferente de todas as outras. Como estou de serviço não tive a oportunidade de seguir para o norte e viver esta época festiva com os meus pais e resto da família. O almoço glorioso de galo, mil e um doces e a companhia calorosa daqueles que mais amo e raramente vejo não aconteceu este ano. Ontem vivi o dia numa tenebrosa mistura de ansiedade e solidão. A atender telefonemas de urgências apenas na companhia da minha gata, só pensava na prespetiva de passar o dia seguinte numa continuidade do que tinham sido as últimas 24 horas. Porém, ao contrário daquilo que esperava, surpreendi-me a mim própria quando hoje acordei feliz. Não consegui evitar sorrir quando vi o sol entrar pela janela, num céu limpo e esplendoroso. Fui tratar do gatinho que estava internado e fui brindada com miados amorosos, marradinhas e o colinho do pobre gato Zeca. Apercebi-me que, tal como eu, o gatinho também estava a passar a Páscoa longe dos seus. Claro que ele não sabe isso, mas senti uma empatia enorme pelo animal quando este pensamento me atravessou a mente.

        Voltei para casa e comecei a preparar o almoço. Quando parei para pensar, apercebi-me que tudo aquilo que estava a cozinhar nada mais era que a tentativa de imitar as tradições que vivi ano atrás de ano. Não tenho um galo do campo para fazer cabidela, mas comprei frango e está no forno a assar. Não tenho bolinhos de Páscoa tradicionais do norte, mas, pelo menos, o ovo Kinder gigantesco está em cima do frigorífico à espera de ser aberto para a sobremesa. O pacote de ovos pequeninos de chocolate já vai a meio. O arroz está a postos para ser cozinhado. Até o sumo que tenho no frigorífico é da marca “Paquito”. Ri interiormente quando me lembrei que não gosto muito daquele sumo. Mas é o que costuma estar presente na mesa da Páscoa, então acabei por deixar o meu subconsciente comprar algo que não agrada muito ao meu palato, mas que me transporta para as memórias que procuro desesperadamente recriar. Não posso ir passear pela avenida à beira mar, mas dou por mim a pensar e planear para onde irei passear depois do almoço. Por vezes, acabamos no sofá, ao final do dia, na casa do meu tio, na companhia uns dos outros, a ver um bom filme. Enrugo a testa, intrigada, ao lembrar-me que passei a manhã toda a pensar que filme gostaria de ver depois do passeio.

       Poderia pensar que ia sentir ainda mais a falta dos meus ao fazer todas estas pequenas coisas que me levam a recordar os momentos bons que passaram. No entanto, apercebo-me que se sucede precisamente o contrário. Desta forma, quase que consigo passar a Páscoa com eles e sinto-me feliz por montar um repasto que não como todos os dias, nem que seja apenas para mim própria. Para além disso, felizmente existem telefones e posso falar com toda a gente quantas vezes quiser. Ontem julguei que hoje me ia sentir amargurada. Parece que o meu íntimo se recusa a desperdiçar um feriado a ser infeliz, quando sou tudo menos isso. Realmente, sinto-me estúpida por ter achado que me poderia sentir mal só porque um ano é diferente dos outros.

       Apesar de não ser cristã, as tradições religiosas perseguem-me. Provavelmente porque significam momentos felizes e calorosos nos braços da família. Por isso recrio aquilo que este ano não consegui ter. Por isso penso que para o ano há mais. Por isso lembro-me que a felicidade é um estado interno e que, na verdade, ser feliz ou não depende mais de nós próprios do que das situações que nos são apresentadas.

27/03/2016

         

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